domingo, 11 de novembro de 2007

Entrevista ao jornal O Povo, de Fortaleza.

Vida & Arte
LITERATURA

Órfãos da bruxaria
Amanda Queirós da Redação
É o fim de Harry Potter para os fãs brasileiros. O último livro da série chega hoje traduzido às livrarias. Em Fortaleza, até uma festa de lançamento será realizada na Siciliano (Del Passeo)

10/11/2007 01:10 Quinto filme da série, Harry Potter e a Ordem da Fênix, foi lançado em junho no Brasil (Divulgação)
Hoje é dia de festa para os fãs do bruxinho Harry Potter. Quatro meses depois do lançamento mundial, o último livro da série de sete volumes chega finalmente às prateleiras brasileiras em sua versão em português. Harry Potter e as Relíquias da Morte, publicado pela Rocco, encerra a saga do bruxo contra o vilão Lord Voldemort. Após as 590 páginas, não tem mais jeito. Acabou de vez. Na falta de algo pelo qual esperar, o que vão ler agora os órfãos deixados pela escritora britânica J.K. Rowling? Aliás, eles vão mesmo ler algo? Para além do fenômeno de massa, Harry Potter conseguiu formar novos leitores? Para estudiosos de literatura infanto-juvenil, a resposta é sim. De acordo com o coordenador do Mestrado em Letras da Universidade de Passo Fundo, Miguel Rettenmaier, pode-se encontrar dois tipos distintos de leitores do bruxo. O primeiro se refere àqueles que se prenderam à imagem da personagem como produto da indústria cultural. O segundo, aos que, mesmo inconscientemente, enxergaram no mundo mágico de Hogwarts um hipertexto para várias mitologias. "Esse seria, digamos, o leitor de Rowling, que, uma vez iniciado nas emoções da leitura dos seus livros, talvez tenha sido inoculado de paixão pela literatura", afirma. Rettenmaier organizou o livro Além da plataforma nove e meia: pensando o fenômeno Harry Potter, que reúne artigos sobre a série. De acordo com ele, o fenômeno Harry Potter conseguiu despertar o olhar dos jovens para uma literatura capaz de funcionar como instrumento de entretenimento e de prazer. "O fato é que a série de livros de Rowling não caiu na mochila escolar dos jovens, não veio a eles como um recurso educativo; caiu na caixa de brinquedos dos meninos... e restituiu a eles uma coisa na qual a escola tem se saído muito mal: proporcionar lazer e prazer", diz o pesquisador. O estudante Victor Ferrere, de 14 anos, foi um desses que se encontrou com a leitura por meio de Harry Potter. Aos nove anos, vieram os primeiros livros da série. No intervalo entre o lançamento de um volume outro, foi a hora de dar chance para outras obras. "Nessa época, eu comecei a procurar livros parecidos com Harry Potter. Agora, já leio outros já nem tão parecidos assim", diz. Entre os favoritos, estão os das séries Artemis Fowl, de Eoin Colfer, e Desventuras em Série, de Lemony Snicket. Ele também já devorou uns três volumes da série Gossip Girl, de Cecily von Ziegesar, que recentemente se tornou seriado de TV. "Esses são bem mais jovens que fantasiosos". Nas mãos dele, clássicos como Senhora e Cinco Minutos, de José de Alencar, também já começam a agradar (apesar de serem leitura obrigatória da escola). A maior parte da biblioteca do também estudante Vladson Lima, de 16 anos, é composta de livros relacionados ao universo potteriano. São mais de 20 livros sobre o tema. Ele não costuma freqüentar livrarias, mas se inteira de novidades literárias pela internet a partir de dicas de outros fãs do bruxo. Foi assim que ele descobriu a série Fronteiras do Universo, de Philip Pullman, por exemplo. "Depois que comecei a ler Harry Potter, as minhas notas em redação subiram muito até porque também comecei a participar de RPG (jogos de interpretação), que trabalham muito com a escrita", afirma. Potter e Rosa De acordo com a professora Cátia Toledo, do departamento de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), esses livros misturam ingredientes comuns para se aproximarem dos jovens, como trama simples, personagens planas, linguagem coloquial, atualidades jornalísticas e, muitas vezes, certa dosagem de sensualidade. Independente da qualidade do escrito, vale a pena ler? "Há alguns professores que acham que quem lê Harry Potter nunca chegará a Guimarães Rosa. Mas quantos brasileiros, que não estudaram Letras, leram ou lerão Guimarães Rosa? Outra questão: só quem lê Guimarães Rosa deve ser respeitado enquanto leitor? A literatura juvenil não tem que criar um só tipo de leitor. Ela pode e deve desenvolver as potencialidades leitoras de cada um dentro de suas particularidades", conclui a professora, cuja tese de doutoramento se voltou para a pesquisa sobre a coleção brasileira Vaga-lume (Ed. Ática), voltada para os jovens. Miguel Rettenmaier concorda e acrescenta um ponto. "A grande questão é que essa leitura, em determinado momento, deve acionar não apenas elementos decodificatórios ou compreensivos. Deve atingir estágios de interpretação, que são mais complexos. Machado de Assis e Guimarães Rosa, por exemplo, são sempre um ponto a atingir quando se está formando leitores".

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